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sexta-feira, 25 de julho de 2025

IRA! - Invisível DJ: A fúria segue visível, o brilho ainda reluz

Mais uma critica revisitada. Essa publicada originalmente aqui, também nos primordios do blog, quando o IRA ! acabava de lançar seu ultimo album antes da briga que acabara com a banda. Posteriormente Scandurra e Nasi fizeram as pazes e voltaram com o IRA! sem os companheiros Jung e Gaspa, onde gravariam mais 2 discos 

 Aqui tambem uma entrevista que fiz com Andre Jung na mesma Época
O que esperar de uma banda com mais de 25 anos de estrada?

 No cenário brasileiro, onde muitas envelhecem como milk-shake no sol, o natural seria apostar na repetição, na nostalgia sem alma, no “remember” morninho embalado pra tocar em loja de conveniência. Mas o IRA! nunca seguiu por aí. Nunca quis ser peça de museu. E Invisível DJ, o novo álbum lançado junto com um DVD ao vivo (sem plateia, mas com punch), prova isso sem precisar gritar. Embora, convenhamos, eles ainda saibam gritar com estilo. 
 Com uma carreira íntegra, o IRA! chegou aqui desafiando o senso comum. Enquanto os discos solos da maioria dos vocalistas e guitarristas de bandas brasileiras soam como sobras do estúdio principal, os voos individuais de Edgard Scandurra e Nasi são ousados, vivos, autorais. Não são apêndices do IRA! — são mundos paralelos. E o DNA da banda se fortalece justamente por isso. 

 E o que dizer de André Jung, dono de uma batida que se reconhece de longe? Coisa rara no rock nacional, onde bateristas costumam ser só o metrônomo de luxo. Jung imprime identidade. A última vez que a gente viu algo parecido foi lá no Paraná, com a Relespública. 

 Mas o IRA! não vive apenas de virtudes técnicas ou currículos individuais. Eles têm história. Têm contexto. Foram uma das primeiras bandas de rock nacional a flertar com o rap — e isso ainda nos anos 80, quando o Nasi virou produtor do gênero, enquanto os colegas de geração ainda chamavam qualquer batida quebrada de “coisa de americano”. 

Nos anos 90, quando estavam longe dos holofotes, gravaram Você Não Sabe Quem Eu Sou — um álbum eletrônico, sujo, corajoso. Era praticamente um disco solo de Scandurra com o nome IRA! na capa, mas quem se importa? Era arte viva, pulsante. Enquanto outros tentavam ressuscitar os anos 80, o IRA! estava jogando o jogo do futuro com as regras do underground.

 E aqui estamos, em Invisível DJ. Um disco que, sem fazer alarde, marca presença. O riff inicial da faixa-título já deixa claro que a guitarra de Scandurra continua sendo um dos melhores guias melódicos do país. O baixo de Gaspa galopa, a bateria cresce, e Nasi canta com aquela urgência apaixonada que diferencia vocalista de intérprete. “Invisível DJ”, a música, entraria fácil em qualquer antologia da banda — mesmo que coletâneas sejam o anticlímax da criatividade, como já dizia o próprio IRA!.

 O álbum como um todo não é uma reinvenção. Mas resiste. Sustenta a audição com dignidade — e, em certos momentos, com brilho. “A Saga”, parceria com Arnaldo Antunes, é poesia urbana em sua melhor forma. É São Paulo transbordando dos amplificadores. "Tomando chuva, tomando sol, tomando uma porrada"... É IRA!, é Arnaldo, é concreto e é lírico. Aos 2:30 da música, você já está embolando a língua com Scandurra sem nem perceber. 

 Tem também os já tradicionais mergulhos na obra solo de Scandurra, como “Culto de Amor” — agora na voz de Nasi. Não é a faixa mais impactante, mas tem sua beleza lírica (“A verdade vem no seu beijo / você nas minhas mãos, eu juro que não tenho medo”) e ainda por cima revive a parceria com Taciana Barros. Clima mais íntimo, quase sussurrado, mas ainda assim IRA!. 

 A regravação de Walter Franco, “Feito Gente”, ganha tratamento hard-rock. “Mariana Foi Pro Mar” traz leveza bem-humorada. “La Luna Llena” surpreende com um espanhol de sotaque flamenco (resquício da fase viajante de Scandurra?) e “Não Basta o Perdão” reconecta com os velhos tempos da banda, num riff direto na veia. 

 Tem também algumas baladas que passeiam entre o sofisticado e o radiofônico. “Eu Vou Tentar” tem teclados safados e vocais harmônicos à la Beach Boys — pena que a letra não acompanha o frescor. Mas deve funcionar ao vivo, porque tem aquele apelo pop que cola fácil. Pena que muita gente vai ouvir e nem sacar as referências. A geração MTV, enfim. 

 Talvez o único senão real do disco seja sua duração. E aqui entra a crítica maior ao formato atual dos álbuns — com a era do streaming, tudo é longo demais, inflado, sem edição. Falta concisão. (Sim, Titãs, estamos olhando pra vocês).Mas isso é papo pra outro dia. 

 No fim, Invisível DJ não é um grito de reinvenção. É um lembrete. O IRA! ainda está aqui. Tocando com verdade. Cantando com paixão. E mantendo acesa uma chama que muitos já apagaram por conveniência. Pode não ser o disco mais ousado da carreira, mas também não precisa ser. Porque o IRA!, quando é IRA! de verdade, já está muito acima da média.



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