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quinta-feira, 18 de setembro de 2025

SAUDADES DA MINHA LEMBRANÇA - O ILUMINADO

Saudades da minha lembrança foi o titulo de um livro que reune, no começo do século algumas crônicas que escrevia para jornais. Adoro esse titulo que algum tempo depois o cantor Nervoso deu por um zeigeist absurdo para o seu primeiro disco solo (Alias tem uma entrevista que fiz com o cantor nesse link)

Hoje não usaria mais como titulo do livro para nao parecer que roubei o titulo,  mas sem pudor de usar aqui no blog nessa serie de artigos onde pretendo rever alguns  textos que hoje acho bem amadores mas de alguma forma as ideias permanecem. Pretendo reescreve-los, tentando deixar mais contemporâneo e ao mesmo tempo que mudo o ponto de vista sobre algumas coisas. No final acrescento o texto original

Indice

Saudades - uma introdução  

Saudades 1 - Homem Aranha

Stephen King odeia O Iluminado. Mas convenhamos: o sujeito que teve a pachorra de dirigir Comboio do Terror não tem exatamente o passe vitalício para sair distribuindo juízos estéticos. O que ele sente, no fundo, é ciúme. Ciúme daquele tipo rancoroso, que nasce quando alguém pega sua ideia, passa um verniz de gênio em cima, e de repente o mundo inteiro esquece que você foi o pai da criança. Kubrick não apenas assinou uma das melhores adaptação de um livro de King: ele fez algo ainda mais cruel — transformou um material apenas razoável em uma obra-prima. E isso não era novidade para ele: já tinha feito com Laranja Mecânica e 2001. (Tá, em Lolita escorregou, mas até Beethoven deve ter errado alguma nota).

Pior para King: O Iluminado não é um filme de Stephen King. É um filme de Stanley Kubrick. E King, que adora ver seu nome grudadinho em cada cartaz, deve ter se sentido como penetra em baile de gala — a festa era dele, mas a orquestra tocava outra música. (Aliás, se até O Passageiro do Futuro, que tinha mais a ver com um videogame ruim do que com King, estampava seu nome, imagina a bronca quando percebeu que Kubrick tinha sequestrado sua obra e não ia devolvê-la).

Kubrick ainda fez um favor imenso: deu dignidade literária a um livro de Stephen King. Antes disso, só De Palma tinha conseguido, com Carrie. Até prefiro o De Palma na comparação, embora seja vitória por pontos, não por nocaute.

Minha primeira experiência com O Iluminado foi aos 14 anos, na casa do Camilo. E aí, Camilo, lembra? Não passamos nem da subida da montanha — a fita parou por ali mesmo, como se o Overlook tivesse mandado um aviso. Uns dois anos depois, enfim, encarei o filme inteiro. Foi de madrugada, na casa de outro amigo, o Daniel (sem você Camilo, perdeu a chance). Estávamos em turma, e o medo foi coletivo. A imagem do pequeno Danny (o do filme, não o dono da casa) deslizando de triciclo pelos corredores ficou martelando na cabeça. E ainda tinha a mulher da banheira, uma Shelley Duvall em frangalhos e um Jack Nicholson em estado de graça — ou de loucura, vai saber.

Nessa época, o Edson, colega de colégio, tinha o livro. Peguei emprestado. Gostei até: tinha aqueles detalhes de passado amaldiçoado do Hotel que o filme ignora. Para um adolescente, não era dos piores. Até hoje, aliás, considero O Iluminado um dos melhores de King. Logo depois comprei Jogo Perigoso — e desisti nas primeiras páginas. Chato demais. King, para nós, era uma obsessão adolescente mais pelo cinema do que pelos livros. Só que os filmes, na maioria, eram ruins. Quando um grande diretor assumia o volante, aí sim: o material medíocre virava clássico.

Tenho para mim que grandes romances quase sempre rendem filmes medianos. Já livros medianos podem render grandes filmes. É o caso de Tubarão, que Spielberg transformou em um épico de suspense aquático, ou dos muitos de Hitchcock que saíram de fontes duvidosas. Até 2001, que nem era livro direito, virou monumento. Mas dificilmente veremos um filme que supere Guerra e Paz, Anna Karenina ou Dom Quixote. Já Stephen King, em geral, tem livros melhores do que os filmes. Mas nesse caso pela incompetência dos Diretores.

Fui conhecer melhor o King escritor mais tarde, na faculdade. Morava numa república com um boliviano, o Gelafito Gutierrez, fissurado em King — comprava tudo. Foi ali que li CarrieAs Quatro EstaçõesCujo… Bons livros mas fui me cansando. King escreve bem, mas nunca sabe parar: é prolixo até dizer chega. Prefiro hoje um filme ruim baseado nele a gastar tempo em um calhamaço. Tentei ler Mr. Mercedes: larguei no primeiro da trilogia. Muito ruim. Aqui acompanhamos o sociopata de frente, o que dá a impressão de um grande vilão, mas é mais um da galeria de King . Acho engraçado como em todos os seus livros que li sempre existe um psicopata. Mesmo um simples estudante do Maine num filme como Conta Comigo tem sua psicopatia elevada a níveis alarmantes. Novembro de 63 é mais palatável, mas tambem abandonei na metade. O homem não tem dó do leitor. Muitos personagens clichês e a ja citada prolixidade de sempre. 

Voltamos para o Iluminado. Em 1997, King resolveu se vingar. Produziu uma refilmagem para a TV onde assumiu o roteiro. O resultado? Uma catástrofe. Não daquela categoria divertida, que envelhece bem e ganha charme trash. Não. Foi ruim no pior sentido possível: burocrático, insosso, sem alma. Se provou alguma coisa, foi apenas que Kubrick era imbatível — e que certas histórias, depois de erguidas ao patamar de obra-prima, não toleram ser rebaixadas sem cobrar um preço constrangedor.

Dizem que há um livro e até uma continuação para o cinema. Mas, honestamente, é melhor deixar os mortos descansarem em paz no Overlook. Até porque, se levantarem de novo, corremos o risco de descobrir que Comboio do Terror foi só um aquecimento.

 



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A seguir o texto original, publicado na época em jornais locais 

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S

tephen King odeia, mas o sujeito que ousou dirigir “Comboio do Terror” não tem moral para falar desta que é sem dúvida nenhuma a melhor adaptação de um livro seu. Na verdade deve ser ciúmes porque ficou muito, mas muito melhor que o livro em que foi baseado, algo não raro na obra de Kubrick que já havia feito o mesmo com “Laranja Mecânica” e “2001” (“Lolita” infelizmente fica fora dessa). Também pesa o fato do filme ser mais relacionado com o Kubrick do que com ele que sempre leva seu nome ao título, até mesmo aqueles que pouco tem a ver com sua obra (Vide o “Passageiro do Futuro”).

 

Kubrick conseguiu ainda uma proeza. Deu dignidade a um livro de Stephen King. Claro que já existia outra boa adaptação, Carrie, e até hoje considero duas das maiores adaptações de King, com uma pequena vantagem de Carrie (De Palma já diz tudo)

 

A primeira vez que tive contato com o  filme eu tinha uns 14 anos, na casa de um amigo meu (e aí , Camilo ?). Não passamos da subida na montanha. Uns dois anos depois finalmente consegui assistir. Estávamos em uma boa turma , de madrugada na casa de outro amigo, o Daniel (O Camilo não estava). E o filme meteu medo, mesmo em grupo. Aquelas imagens do Danny (o do filme, não o dono da casa) andando de triciclo pelos corredores do Overlock não me saia da cabeça. E ainda por cima tinha a cena da banheira, uma Shelley Duvall desesperada e um Jack Nicholson irrepreensível. 

 

Em 1997 Stephen King concebeu o roteiro para um refilmagem televisiva. Não é das piores mas pelo menos ele provou algo que todos já sabiam. O de Stanley Kubrick é imbatível.

 

 

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