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segunda-feira, 15 de setembro de 2025

ENGLISH TEACHER


Vinda de Leeds, cidade com uma tradição musical robusta que vai do pós-punk político do Gang of Four ao gótico teatral do The Sisters of Mercy, passando pelo synthpop ousado do Soft Cell, o pop de estádio dos Kaiser Chiefs e a anarquia folk do The Mekons, a banda English Teacher chega com um cartão de visita mais complexo do que o habitual no circuito indie britânico.

Formada por Lily Fontaine (vocais e guitarra), Douglas Frost (bateria), Nicholas Eden (baixo) e Lewis Whiting(guitarra), o grupo tem chamado atenção não só pelo som, mas pelo conteúdo — e pelo cuidado em não parecer mais um clone do pós-punk 2.0.

O diferencial é claro: letras afiadas, literárias e politizadas. Fontaine escreve com precisão e intenção. Os temas vão de classe e raça a autoimagem, e sempre com uma ironia que funciona — diferente de certas bandas que confundem cinismo com profundidade. Em músicas como “Polyawkward” e “Song About Love”, ela transforma constrangimentos cotidianos em comentários sociais sutis (ou nem tanto), sem perder o tom emocional.

O álbum de estreia, This Could Be Texas (2024), marca esse olhar deslocado: geograficamente, simbolicamente, sonoramente. Não há pressa em agradar, tampouco reverência excessiva aos heróis do passado. Quando soa mais melódico, lembra Radiohead da fase The Bends. Quando endurece, evoca o Sonic Youth mais acessível. Tudo isso sem se perder na fórmula “baixo + fala arrastada + pose”, repetida ad nauseam por colegas de cena como Dry Cleaning e Squid.

O vocal de Fontaine é outro ponto forte: expressivo, instável no melhor sentido. Ela alterna falas secas e canto melódico sem soar forçada, algo que muitas bandas "faladas" ainda não aprenderam.

No palco, essa identidade se confirmou no show da banda no C6 Fest, em São Paulo, no dia 25 de maio de 2025. Em meio a uma tarde abafada e a um público dividido entre fãs de Wilco e adolescentes de cabelos coloridos deslumbradas pelo glamour do Last Dinner Party, o English Teacher entrou em cena com o que parecia uma missão ingrata: convencer os desavisados. E convenceu. Sem figurinos, sem coreografia, sem grandes discursos. Apenas música, presença de palco e uma química evidente entre os integrantes.

Fontaine  entrega carisma e intensidade. Uma postura meiga, mas firme, que não apagava o magnetismo. No show do C6 Fest, Lily Fontaine entrou no palco vestindo um conjunto de moletom com a blusa aberta que deixava à mostra um top. Apesar da peça ser bastante ajustada, ela transmitia uma aura meiga, longe de parecer agressivamente vulgar. Conforme o show avançava, Fontaine tirou a blusa, um gesto que acrescentou presença e intensidade à performance. Essa mistura de delicadeza e confiança revelou uma artista que domina tanto a música quanto a construção do próprio visual no palco.

Ao meu lado, um cara  — claramente sem intenção machista, ao contrario até — comentou, meio envergonhado, como pode ser complicado para ele como Homem não se perder em pensamentos. Achei engraçado a própria negação. O que o Mundo está fazendo às pessoas !

A banda como um todo foi precisa: Whiting criou camadas sutis com sua guitarra, Eden segurou a base com segurança, Frost deu peso e variação à bateria, e a presença da violoncelista Blossom Caldarone trouxe um refinamento às músicas mais suaves.

A performance foi direta, bem executada e — talvez o mais importante — sem afetação. Um show que soou maior do que parecia, e mais íntimo do que se esperava.

Entre os destaques, a faixa “You Blister My Paint” (video acima) impressionou por fugir do padrão sonoro do álbum. Em vez das guitarras angulosas e andamentos quebrados, a música adota uma abordagem mais etérea, quase dream pop. A voz de Fontaine aparece com leve autotune, flutuando sobre um instrumental contido e emotivo. É um momento de vulnerabilidade que mostra uma faceta mais introspectiva da banda — e que funciona sem esforço.

Ainda há o que evoluir: algumas faixas do disco parecem mais rascunho do que obra acabada. Mas ao contrário de tantas bandas que entregam tudo no primeiro álbum e somem, o English Teacher parece ter fôlego — e ideias — para continuar relevante. E se o nome da banda sugere uma certa seriedade, o que se vê é justamente o oposto do didatismo: há curiosidade, arestas e uma recusa saudável em ser óbvio.

Nem sempre a crítica britânica acerta quando elege sua nova aposta. Mas desta vez, vale prestar atenção.

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