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quinta-feira, 9 de outubro de 2025

Mistérios, Mitos e Pseudoarqueologia: bem-vindo ao mundo de Martin Mystère


Martin Mystère é um personagem da editora italiana Bonelli, criado em 1982 por Alfredo Castelli, depois de anos de tentativas frustradas de lançar um herói sob outros nomes e formatos — inclusive como Allan Quatermain em 197. Paralelo a isso a versão em quadrinhos dos livros do Docteur Mystere pelo próprio Castelli na mesma época serviram de base para o personagem (a Mythos chegou a lançar 2 álbuns sobre a personagem, numa versão moderna mas não temos mais nada em Portugues), Docteur tambem foi incorporado na mítica do Personagem como um antepassado numa historia homônima lançada pela mesma Mythos na quase recente edição 23  da segunda serie.

Nesse intervalo, Hollywood já havia consagrado o arquétipo do arqueólogo aventureiro com Os Caçadores da Arca Perdida (1981), mas a “vibe” do quadrinho foi para outro caminho: pouca ação, muitas investigações e páginas repletas de diálogos — o que afastou parte do grande público. Não à toa, mesmo na Itália a revista nunca foi campeã de vendas, ficando atrás de vários outros personagens Bonelli, especialmente Dylan Dog, criado alguns anos depois e que, durante muito tempo, foi o verdadeiro best-seller da casa, chegando até a inspirar um festival próprio, o Dylan Dog Horror Fest

A comparação entre Mystère e Dylan Dog não é mero capricho: além das afinidades de tom e temática, os dois personagens já dividiram três crossovers e aparecem frequentemente citados nas aventuras um do outro.No Brasil, Mystère estreou em 1986 pela Editora Globo (que no primeiro número ainda se chamava RGE), em uma coleção de 13 edições que, na prática, publicou apenas as 12 primeiras aventuras italianas, já que algumas histórias começavam numa revista e terminavam em outra — exatamente como acontecia também na Itália mas com algumas mudanças que criaram essa edição "extra". 


Em 1990, o personagem ressurgiu pela Editora Record, que no primeiro volume republicou justamente as duas primeiras histórias de Mystère. Vale a curiosidade: a versão da primeira aventura lançada pela Record era ligeiramente diferente daquela publicada pela Globo, já que na Itália a história havia recebido alterações nas republicações. Assim, as duas edições brasileiras acabaram trazendo pequenas diferenças entre si, detalhe saboroso para quem gosta de comparar versões.

 A partir do segundo número, a Record seguiu a cronologia onde a Globo havia parado, publicando a edição 13 da série italiana. Só que a fidelidade durou pouco: a partir da quinta edição, a Record começou a pular números, republicar material da fase Globo e até inserir três volumes da série especial italiana. No total, foram 17 edições, e foi justamente através delas que conheci o personagem.

Formado em Antropologia e Arqueologia, Martin Mystère é descrito como um sujeito peculiar, dono de uma curiosidade insaciável e de um apartamento abarrotado de livros e bugigangas — algumas das quais bastante úteis, como sua arma de raios paralisantes. Seus parceiros de aventuras são tão singulares quanto ele: Java, um homem de Neandertal sobrevivente à extinção da própria espécie, e Diana Lombard, a companheira que, após muitos anos, conseguiu levar o “detetive do impossível” ao altar.


Em 2002, Martin Mystère voltou às bancas brasileiras, desta vez pela Mythos. A ordem de publicação não seguia grande lógica, mas ao menos permitiu resgatar várias histórias que a Record havia deixado de lado. Essa fase se estendeu até 2006 e somou 42 edições. Infelizmente não tenho essa série. É de uma epoca onde parei de ler quadrinhos, que durou algo entre 1997-2012, embora tenha esporadicamente comprado alguma coisa.

O personagem só retornaria em 2018, novamente pela Mythos. A série foi reiniciada do número 1 e, nas três primeiras edições, seguiu fielmente a cronologia italiana de onde havia parado na fase anterior. Mas a disciplina durou pouco: logo a editora voltou ao velho hábito de publicar histórias fora de ordem, incluindo números muito adiantados em relação ao que estava em aberto. 

Ainda assim, essa segunda fase chegou a 36 edições e avançou bastante a cronologia, trazendo aventuras já na altura do número 300 da série original italiana. No fim, parecia até um retrato em quadrinhos do próprio Brasil: quando tudo começa a seguir uma ordem, alguém resolve embaralhar as páginas. Ao menos aos poucos ha progresso, mesmo que infelizmente só nos quadrinhos.

A adaptação animada de Martin Mystère, lançada em 2003, é um daqueles casos curiosos em que uma boa ideia se perde na ânsia de ser “moderna”. Produzida pela Marathon Animation em parceria com a RAI e a Canal J, a série transformou o erudito e irônico “detetive do impossível” de Alfredo Castelli em um adolescente genérico de cabelo espetado, pronto para enfrentar monstros e enigmas semanais com a irmã Diana e o inseparável Java — agora um homem das cavernas domesticado que mais parece alívio cômico de sitcom. O resultado é uma versão que mantém o verniz do mistério, mas esvazia seu conteúdo.

Enquanto o Martin das HQs investigava o elo entre ciência e mito com o olhar de um cético fascinado, o da animação parece um caça-fantasmas teen moldado à estética pós-Scooby-Doo e Ben 10. A trama é episódica, previsível, e reduz o tom filosófico e histórico do original a um desfile de monstros, portais e relíquias mágicas. O que era reflexão vira fórmula: cada mistério é resolvido com uma explosão ou uma piada.

Ainda assim, há mérito em como a série preserva — ainda que diluída — a noção de que o mundo é um grande arquivo de segredos esperando ser decifrado. O problema é que o Martin Mystère animado parece ter medo de sua própria complexidade. É um produto da época: ágil, colorido, hiperativo e permanentemente em busca da próxima “missão”. Um desenho divertido, sem dúvida, mas que trocou a curiosidade adulta e iconoclasta de Castelli por uma aventura ligeira demais — onde o mistério virou entretenimento, e o impossível, apenas mais um episódio da semana.


Para os fãs mais fiéis — e, sobretudo, para aqueles que nunca se aventuraram em Mystère justamente por gostar de ordem cronológica — surgiu uma nova esperança: a Editora 85. O projeto, lançado em formato de encadernados, vem trazendo 5 edições italianas por volume, agora em ordem linear. A proposta é clara: publicar as histórias completas dentro de cada encadernado, sem aquela fragmentação que na Itália, durante muito tempo, fazia uma aventura começar numa edição e terminar na seguinte.

 Para efeito de comparação, o primeiro volume da 85 reune as edições italianas 1 a 5, totalizando cinco histórias. Já o segundo volume, apesar de ter número de páginas parecido e cobrir as edições 6 a 10, trouxe apenas três aventuras — maiores, densas, e ainda mais representativas da fase inicial de Mystère. Você pode comprar essa 2 edições nesse link , lembrando que durante a pre venda quem comprar as 2 edições ganha frete grátis.



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