As pessoas parecem ter uma dificuldade danada em entender que o Programa do Jô é, antes de tudo, um programa de humor. Sério, fico me divertindo com a turma que leva aquilo a ferro e fogo, como se fosse uma sessão solene da Academia Brasileira de Letras. E pior: tem fã que encara tudo aquilo como se fosse o discurso da ONU.
Volta e meia, quando assisto algum cantor ou cantora que gosto, dou aquela bisbilhotada nos fóruns, principalmente no Orkut — aquele museu dos nossos tempos — e vejo uma legião de xingamentos que faria até o mais paciente dos monges tirar o salto. Aí fico pensando: será que essas pessoas nunca assistiram ao programa do Jô? Ou será que não perceberam que o que rola ali é uma mistura de bate-papo com comédia, um “stand-up” leve, tipo aquele tio meio louco que faz piada na ceia de Natal e você finge que acha engraçado?
O barato do programa é justamente a habilidade do Jô de despir o cantor daquela pose séria, quase sacra, e mostrar um lado mais humano, mais mundano. O problema é que a raça dos fãs é praticamente inimiga do bom humor. Não todos, claro, mas aqueles fãs xiitas — que, às vezes, nem são tão fanáticos, mas perderam o senso crítico em algum ponto do caminho e vivem numa espécie de delírio coletivo, tipo um culto ao santo vinil.
Quando o artista é obrigado a tocar antigos sucessos, a turma já reclama, “ai, só toca essas velharias”. Quando toca algo novo, inédito, é outro horror: “Mas que porcaria é essa? Cadê o som que eu gostava?” É claro que às vezes o novo não é lá essas coisas — eu mesmo já ouvi umas músicas que me fizeram pensar se o microfone não estava ligado pra captar o som ambiente — mas muitas vezes é só preguiça do fã em abrir a mente para o novo.
E olha, uso o termo fã, mas será que isso é fã mesmo? Ou “Maria vai com as outras” que só repete o que o coleguinha da internet falou? Porque, convenhamos, fã que é fã não deveria ser tão facilmente manipulável — e sim capaz de rir do próprio ídolo, afinal, ninguém é santo, nem o João Gilberto, que deve ser o cara mais sisudo da face da terra, mas tenho quase certeza que em casa ele deve rir de alguma piada besta, mesmo que só por educação.
Pense no fã do Los Hermanos, por exemplo — essa galera que disputa com os do Legião Urbana e Raul Seixas o título de fã mais “cru” do país. Já pensou o que seria ver o Marcelo Camelo rindo com o Amarante falando de churrasco, papo furado, essas coisas mundanas? Seria o fim do mito, o apocalipse da seriedade da banda!
Ontem, por exemplo, a vítima da vez foi a cantora Tiê. Um pouco tímida, sim, mas que soltou um lado dela que poucos conhecem. Jô, com seu jeito quase paternal, foi puxando as curiosidades da cantora como quem caça marimbondo com vara curta: devagar, com jeitinho, mas sem deixar escapar nada. Aí vem os fãs, que já sabem tudo — ou acham que sabem — e querem ouvir só a mesma ladainha de sempre, como se eles fossem os donos da verdade.
E não adianta: o fã morre de medo de que a imagem do ídolo se quebre, que o “mito” vire gente como a gente — que, aliás, é exatamente o que o programa do Jô tenta mostrar. Tem também o fã enciumado, que fica bravo porque o artista que ele jurava exclusivo está agora na boca do povo, depois de aparecer num programa que tem audiência. Claro, o fã legítimo é aquele que estava lá desde a fase underground, antes do artista ter site, blog, Twitter e até canal no TikTok.
Agora, vamos combinar: a internet revolucionou tudo, isso é fato. Mas muitos artistas ainda não sacaram que, por mais que o YouTube e Spotify ajudem a espalhar o som, o alcance popular só vem mesmo pela velha e boa TV e rádio. A internet é um reflexo disso, uma espécie de espelho onde a gente procura o que viu no outro meio. Mallu Magalhães, por exemplo, bombou no MySpace, mas só virou fenômeno nacional depois que apareceu no Jô e no Faustão — isso para o bem e para o mal, claro.
No fim das contas, o artista que acha que pode viver só da internet está meio enganado. O melhor é usar a rede como uma ferramenta a mais, um atalho para se conectar com o público, mas jamais esquecer que ainda tem muita gente que prefere sentar no sofá, ligar a TV e ver um programa na boa, sem precisar ficar mudando de aba no navegador.
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